O "Ferrugem" e a Lua, 50 anos depois
Prof. Dulcidio Braz Júnior
20/07/2019 17h00
Foi assim, numa TV de tubo de raios catódicos, ainda em preto e branco, que eu vi a conquista da Lua.(Crédito: Beltmann/CORBIS /Fonte: www.roadtoapollo50th.com)
No final dos anos 60, meu pai sempre trazia para casa jornais e revistas com reportagens sobre as missões Apollo para mostrar para mim. E eu ficava maluco na medida em que a derradeira viagem para Lua ficava cada vez mais próxima. Já havia ali a sementinha de um físico que iria se apaixonar cada vez mais por Ciência e, em particular, por Astronomia.
E foi em 20 de julho de 1969, numa TV de tubo de raios catódicos, em preto e branco, e em baixa resolução, mais ou menos como o garotinho da foto acima, que pude acompanhar a chegada na Lua pelos americanos da missão Apollo 11.
Hoje, 20 de julho de 2019, completamos exatos 50 anos anos desta histórica aventura. 50 voltas da Terra — o Pálido Ponto Azul¹ — no Sol! O tempo passou rápido demais!
Em meados de 1969, com quase seis anos de idade, eu começava a ler. E adorava!
O garotinho "enferrujado" da foto sou eu, em 1969. (arquivo pessoal)
O devorador de gibis e das manchetes de jornais e revistas sobre as missões Apollo 11 era um ruivinho "enferrujado" de sardas nas bochechas e nos braços que levava muito a sério a tosca série "Perdidos no Espaço"² (Lost in Space, no original em inglês) que passava na TV aberta. TV aberta, claro! Naquela época não havia TV paga e no interior tínhamos que nos contentar com três ou quatro canais captados por antenas externas que, ao sopro de um vento um pouco mais forte, girava e perdia o sinal, tirando a programação do ar.
Apesar dos cenários e efeitos bizarros da série, muito mais pela imaginação do garotinho sonhador, Lost in Space parecia-me muito realista.
Mas insisto: nada de cores! Era tudo em preto e branco. Ou tons de cinza, se preferir. Imagine a cena acima, mas sem cores. Melhor que imaginar, veja-a.
Converti a imagem do elenco da série para tons de cinza na tentativa de dar uma ideia para quem não viveu naquela época de como eram as imagens da TV. Mas a tentativa passa longe da realidade! Não era só uma questão de falta de cores. Era também um problema de baixíssima resolução. Mas o melhor que tínhamos.
Assim como a imagem lá do topo do post, a fotografia abaixo ilustra de maneira mais realística como eram as imagens de TV no final dos anos 60 aqui no Brasil e, portanto, como eu assisti pela TV a conquista da Lua.
A conquista da Lua pela TV de tubo em 1969. (Fonte)
Hoje, meio século adiante, com câmeras de alta resolução presentes até mesmo em dispositivos móveis que, vale lembrar, têm poder de processamento imensamente maior do que o computador de bordo da missão Apollo 11, a NASA promete voltar à Lua em 2024. Aquele garotinho de sardas, sonhador, que ainda mora dentro de mim, volta a ficar excitado com a ideia! E sabe que agora a cobertura será feita em full HD, ou talvez em 4K, com câmeras 360 graus, tudo em cores e com som super limpo. Muito mais realístico e divertido!
É incrível tudo o que aconteceu na Ciência e na Tecnologia neste meio século! Tive o privilégio de viver cada segundo desta saga humana e, para me aproximar ainda mais disso tudo, estudar Física numa excelente universidade pública. Trabalhei com pesquisa, nutrindo o sonho de ser cientistas, mas acabei me apaixonando irremediavelmente pela educação que virou trabalho e pela divulgação científica que se tornou uma diversão.
Hoje acordei pensando em milhares de possíveis textos sobre as missões Apollo para comemorar a data histórica. Mas, sabendo que o assunto estaria presente em jornais, revistas, TV, internet, youtube, redes sociais, …, e em todo o planeta, resolvi escrever um post mais intimista e apresentar para os meus leitores do blog o "ferrugem".
A história do "ferrugem" certamente é parecida com a história de outros(as) tantos(as) garotinhos(as) dos anos 60 espalhados(as) pelo mundo. Mas só eu posso contá-la em primeira pessoa. Não vi melhor maneira de comemorar os 50 anos da Apollo 11!
Para quem quer saber mais sobre a Conquista da Lua e as missões Apollo, indico logo abaixo alguns textos/vídeos/sites bem bacanas.
¹ Pálido Ponto Azul (Pale Blue Dot, em inglês) é o apelido dado ao planeta Terra por Carl Sagan ao ver a imagem da Terra capturada em 14 de fevereiro de 1990 pela sonda Voyager 1 a 6 bilhões de quilômetros de distância.
² Jeannie é um gênio (I dream of Jeannie, no original em inglês), uma comédia que envolvia astronautas da NASA bem atrapalhados, é outra série que fazia a cabeça do "ferrugem" em 1969.
Para saber mais
- De passo em passo (artigos do UOL Tecnologia)
- Doodle do Google – a imagem leva ao vídeo abaixo narrado por Mike Collins, o astronauta que não desceu em solo lunar mas teve a missão importantíssima de manter o módulo de comando orbitando a Lua enquanto Armstrong e Aldrin alunissavam com a Águia, uma pequena nave que na prática serviu como uma espécie de elevador entre o módulo lunar e o nosso satélite. Pousar uma grande nave em solo lunar seria desperdício de energia. O módulo de comando, orbitando a Lua, foi o "truque" para economizar energia e garantir a volta dos três astronautas para a Terra.
- 'Semana da Lua' terá eventos, anúncios e até lançamentos (texto do jornalista Salvador Nogueira do blog Mensageiro Sideral)
- Ciência de foguetes e os 50 anos da maior errata espacial do New York times (outro texto do jornalista Salvador Nogueira do blog Mensageiro Sideral)
- Apollo 11 em real time (site criado pela NASA com material em audio, vídeo e fotografias da missão Apollo 11 como se ela estive acontecendo agora, em 2019. Abra em full screen e viaje! No momento em que estou escrevendo este texto, entrei neste site e me deparei com a visão da Terra a partir da órbita lunar, coincidentemente a imagem que mais marcou a memória afetiva do "ferrugem". Reproduzo-a abaixo.)
Abraço do prof. Dulcidio! Física na veia!
Sobre o autor
Dulcidio Braz Jr é físico pelo IFGW/Unicamp onde atuou como estudante e pesquisador no DEQ – Departamento de Eletrônica Quântica no final dos anos 80. Mas foi só começar a lecionar física para perceber que seu caminho era o da educação. Atualmente, além de professor, é autor de material didático pelo Sistema Anglo de Ensino / Somos Educação e pela Editora Companhia da Escola. É pioneiro no Brasil no ensino de Relatividade, Quântica e Cosmologia para jovens estudantes do final do ensino médio e início do curso superior. E faz questão de dizer que, aqui no blog, é professor/aluno em tempo integral pois, enquanto ensina, também aprende.
Sobre o blog
"O Física na Veia! nasceu em 2004 para provar que a física não é um “bicho papão”. Muita gente adora física. Só que ainda não sabe disso porque trocou o conteúdo pelo medo. Se começar a entender, vai gostar. E concordar: a Física é pop! Pelo seu trabalho de divulgação científica, especialmente em física e astronomia, sempre tentando deixar assuntos árduos mais leves sem jamais perder o rigor conceitual, o Física na Veia! foi eleito por um júri internacional como o melhor weblog do mundo em língua portuguesa 2009/2010 pelo The BOBs – The Best of Blogs da alemã Deutsche Welle."