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Física na Veia

4...3...2...1... e começou oficialmente o Inverno 2020 no hemisfério sul!

Prof. Dulcidio Braz Júnior

20/06/2020 18h43

A linha azul mostra o movimento anual aparente do Sol em relação à Terra² e o disco amarelo a posição aparente do Sol neste solstício. (Astrocard de autoria prof. Irineu Gomes Varella, competente e reconhecido astrônomo brasileiro)

 

No exato momento em que este post foi ao ar, às 18h43min (horário de Brasília), começou oficialmente a estação do inverno no hemisfério sul da Terra. Confira os dados logo acima no astrocard do prof. Irineu Gomes Varella, generoso e competente astrônomo que, pelos seus astrocards, espalha conhecimento de Astronomia pelas redes sociais.

No seu perfil no Facebook prof. Irineu enfatiza que "É importante destacar que os solstícios (ou os equinócios) não têm duração: eles OCORREM em um dado instante. É comum se ver nas redes sociais que o "solstício de inverno começa em 20 de junho …". Erro que também se verifica quando se fala, por exemplo, das fases da Lua: "a Lua Cheia vai ter início às 17h 38min …". Lua Cheia também ocorre. Não dura!".

Entendeu o recado do prof. Irineu? O solstício de inverno para o hemisfério sul (e de verão para o hemisfério norte) é um instante exato e ocorreu hoje às 18h43min, momento em que aqui no hemisfério sul do nosso planeta terminava a estação do outono e começava a estação do inverno que vai durar 95 dias, 15h e 48min até a data do equinócio de primavera no hemisfério sul (ou de outono no hemisfério norte).

As estações do ano são períodos de tempo que duram meses. Solstícios e equinócios são instantes em que a Terra passa por um ponto exato da sua órbita ao redor do Sol. Se ficou interessado no tema, veja mais detalhes logo abaixo.

 

Por que temos quatro estações no ano?

A explicação para as quatro diferentes estações no ano vem do fato de que a quantidade de radiação solar que chega aos dois hemisférios da Terra varia no decorrer do ano ou, se preferir, depende do ponto exato onde o nosso planeta se encontra em sua órbita em relação ao Sol.

Como o eixo de rotação da Terra tem inclinação constante em relação ao plano da órbita da Terra ao redor do Sol, o nível de insolação varia no decorrer do ano. Nos períodos mais quentes num determinado hemisfério da Terra, chega ali mais radiação solar. De maneira oposta, nos períodos mais frios, como no nosso inverno que acaba de começar hoje, chega menos radiação solar em nosso hemisfério. Nas duas datas do ano conhecidas como equinócios, e que ocorrem quando começam o outono e a primavera, as estações de temperatura mais amenas, a radiação solar banha igualmente os dois hemisférios.

As figuras abaixo foram obtidas através do Seasons Simulator, animação interativa em Flash que faz parte de uma vasta coleção de aplicativos gratuitos e muito bem feitos para o ensino de Astronomia na Universidade Nebraska-Lincoln. Elas ilustram o movimento de translação da Terra em torno do Sol e mostram de forma didática como os raios solares banham de forma diferencial a superfície do globo terrestre ao longo de um ano (uma translação completa do nosso planeta em torno do Sol). A rigor, por conta da inclinação do eixo de rotação da Terra em relação ao plano orbital, a inclinação com que os raios solares paralelos¹ atingem a Terra varia a cada instante.

Note que em todas as figuras temos sempre três quadros (ou cenas). No quadro maior, à esquerda,  sempre podemos localizar a exata posição real do nosso planeta ao redor do Sol num determinado instante (um solstício ou um equinócio). No quadro menor superior à direita podemos conferir como os raios solares que chegam na Terra. Nesta cena mantive um observador (homenzinho) ao sul do equador para a latitude de 21,9 graus ao sul do equador, latitude de São João da boa Vista, SP, minha cidade . E, finalmente, no quadro menor inferior à direita temos a visão dos raios solares que chegam na Terra exatamente no local do observador (homenzinho). Começando pelo solstício de hoje, ao qual atribuí o instante t0, chamei os outros equinócios e solstícios de t1, t2, t3 e t4 (este último um ano depois de t0).

Solstício (t0 = 20/06/2020)

Solstício de inverno no hemisfério sul.

Como podemos verificar na ilustração acima, no solstício que marca o início do inverno no hemisfério sul (ou início do verão no hemisfério norte), como o que aconteceu hoje exatamente às 18h43min (horário de Brasília), os raios solares praticamente paralelos¹ banham muito mais o hemisfério norte do que o Sul. Por isso, lá ao norte do equador, as temperaturas médias diárias serão mais altas durante a próxima estação (verão) enquanto que aqui ao sul do equador, com menor insolação, serão mais baixas.

Equinócio (t1 = 22/09/2020)

Equinócio de primavera no hemisfério sul

No próximo equinócio (de primavera no hemisfério sul e de outono no hemisfério norte), os raios solares estarão iluminando os dois hemisférios de forma simétrica, incidindo perpendicularmente à linha do equador. Neste exato momento ocorrerá o fim do inverno e início da primavera aqui no hemisfério sul. Ao norte do equador estará findando o verão e começando o outono. Teremos uma estação de temperaturas mais amenas em ambos os hemisférios.

Solstício (t2 = 21/12/2020)

Solstício de verão no hemisfério sul

No solstício de verão para o hemisfério sul (ou de inverno para o hemisfério norte), daqui a seis meses, será o fim da primavera e início do verão aqui no hemisfério sul terrestre. Note que neste momento os raios solares estarão incidindo de forma mais direta no hemisfério sul, onde as temperaturas médias diárias vão crescer. No hemisfério norte, ao contrário daqui, as temperaturas médias diárias vão baixar pois lá estará findando o outono e começando o inverno.

Equinócio (t3 = 20/03/2021)

Equinócio de outono no hemisfério sul

Chegamos a outro equinócio, o de outono no hemisfério sul (ou de primavera no hemisfério norte), já no ano seguinte. Os raios solares praticamente paralelos¹ estarão novamente iluminando os dois hemisférios de forma simétrica, incidindo perpendicularmente à linha do equador. Neste exato momento ocorrerá o fim do verão e início do outono aqui no hemisfério sul. Ao norte do equador teremos as estações opostas. Estaremos novamente num período de temperaturas mais amenas em ambos os hemisférios.

Solstício (t= 21/06/2021, repetição de t0)

Solstício de inverno no hemisfério sul.

Contando do solstício de inverno do ano anterior, a Terra terá completado uma volta ao redor do Sol. Teremos outro solstício de inverno no hemisfério sul (ou de verão no hemisfério norte). E o ciclo anual das estação vai se repetir.

É importante notar nas imagens estáticas (prints do aplicativo) acima que a inclinação dos raios solares que atingem a Terra vai mudando gradativamente no período de um ano, quando então o ciclo das estações se repete.  E é isso que provoca diferentes níveis de insolação em diversas regiões nos dois hemisférios do planeta, moldando as temperaturas médias diárias e caracterizando as quatro estação do ano. Deu para entender?

Mas nada como você fazer as simulações com as próprias mãos. Em vez de imagens estáticas, você terá animações interativas e vai ver a Terra orbitando o Sol em sua órbita completa e não apenas em solstícios e equinócios. Eu capturei as imagens apenas nestes instantes para ilustrar o post. Mas no simulador o movimento do nosso planeta é contínuo. Experimente! É divertido e muito didático! Por isso repito aqui o link passado lá em cima: Seasons Simulator. Atente para o fato de que o seu navegador de internet precisa rodar o Flash Player para ver a simulação.

Se quiser aprofundar o tema estações do ano, neste outro post falo mais detalhadamente sobre o movimento anual da Terra ao redor do Sol e as quatro estações separadas pelos solstícios e equinócios sucessivos, instantes (e não períodos) de tempo, como bem nos chama a atenção o prof. Irineu Gomes Varella e que logo acima chamei de t0, t1, t2, t3 e t4. (repetição de tapós um ano).

 

O movimento solar aparente do Sol ao longo de um ano

O Sol nascente registrado ao longo de um ano em solstícios e equinócios consecutivos (entre 2017 e 2018)

 

A cada dia o Sol nasce do lado leste (e não exatamente no ponto cardeal leste), passa sobre nossas cabeças, e se põe do lado oeste (e não exatamente no ponto cardeal oeste). Somente nos equinócios o Sol nasce exatamente no ponto cardeal leste e se põe no ponto cardeal oeste.

Se você observar o Sol nascendo, ascendendo ao céu durante a manhã e novamente descendo até se por, dia após dia, ao longo de um ano vai perceber que o arco aparente do Sol no céu muda a cada dia. E os pontos do Sol nascente e poente também. É preciso paciência para ir fazendo as observações ao longo de um ano. Não precisa ser todo dia, mas umas duas ou três vezes por semana para ver como o movimento aparente do Sol no céu vai mudando.

Entre 2017 e 2018 resolvi registrar o Sol nascente da janela do meu apartamento em solstícios e equinócios sucessivos, nos instantes que acima chamei de t0, t1, t2, t3 e t4. O resultado você confere na montagem logo acima. Veja como o Sol nascente parece "dançar" ao redor do ponto central (leste). Hoje, no solstício, o Sol nasceu na posição de máximo afastamento para esquerda (a rigor, para o norte) em relação ao ponto cardeal leste. Se quiser saber mais sobre o assunto, leia este post. É nele que publico pela primeira vez a imagem acima com a montagem do ponto do Sol nascente entre dois invernos consecutivos (2017 e 2018).

Inverno 2020

Ilustração do Sars-CoV-2, vírus causador da CoViD-19 (crédito: Fusion Medical Animation/ Unsplash)

Na estação fria, todos sabemos que a ocorrência de doenças respiratórias aumenta drasticamente.  E, embora a temperatura ambiente não seja fator predominante na ação do vírus Sars-CoV-2, algo ainda em estudos, tudo indica que temperaturas menores aumentam o risco de contaminação. Por isso, com a chegada do inverno, todo cuidado com a saúde!

Se puder, fique em casa. Se tiver que sair, tome todos os cuidados, desde o uso contínuo de máscara protetora até o uso de álcool em gel nas mãos. Evite tocar olhos, nariz e boca, exceto de tiver certeza de que suas mãos estão devidamente desinfetadas. E mantenha distância segura das outras pessoas.

Teremos um inverno atípico. Sair de casa para tomar um saudável solzinho quente e revigorante pode significar risco de contaminação. Mas, com o devido cuidado e dentro do que prevê a Ciência, passaremos por tudo isso com o menor impacto possível sobre o nosso país. Infelizmente, o "menor impacto possível" já nos custou milhares de vidas. Mas, sem os devidos cuidados, o cenário trágico poderia ser ainda pior. Façamos pois, cada um de nós, a nossa parte!

 

Abraço do prof. Dulcidio! Cuide-se! E Física na veia!

 


¹ O Sol emana radiação visível e invisível em todas as direções. Apenas uma pequena porção de raios solares atinge a Terra. Como o Sol está bem longe da Terra, quase 150 milhões de quilômetros, os raios solares que aqui chegam são praticamente paralelos. A rigor, tem uma inclinação de cerca de 0,5 grau que, para efeitos práticos, podemos desprezar e assim considerar o paralelismo dos raios por aproximação. Clique aqui e leia post onde abordo a questão dos raios solares praticamente paralelos e como são usados para acender a tocha olímpica.
² Um leitor, que infelizmente identificou-se apenas como "visitante", fez uma observação muito interessante sobre o Astrocard do prof. Irineu. Veja nos comentários o que ele disse e a minha resposta a ele. Motivado pela observação deste leitor, criei esta segunda nota em destaque lá na imagem do topo do post. No Astrocard a Terra foi tomada como referencial. Não estamos querendo dizer que a Terra é o centro do Sistema Solar. Todos sabemos que não é. Mas podemos, na Física ou na Astronomia, escolher o sistema de referência que melhor nos convém na descrição do fenômeno estudado. Neste caso, estamos representando o movimento anual aparente do  Sol em relação a Terra. Neste outro post, quando do início do verão de 2019 (solstício de verão no hemisfério sul), publiquei o Astrocard abaixo também de autoria do prof. Irineu. Notem a posição aparente do Sol em relação à Terra, oposta à posição que ocupa neste solstício de inverno. 

Em 20 de março de 2019, equinócio de outono no hemisfério sul, também publiquei Astrocard do prof. Irineu e que reproduzo abaixo para efeito didático. Notem que no equinócio, neste sistema de coordenadas centrado na Terra, o Sol cruza o equador celeste. 
Astrocard

 

Você consegue agora imaginar onde estará o Sol no equinócio de primavera? Veja os tr~es Astrocards do prof. Irineu, pense, e responda num comentário!

Espero ter sanado toda e qualquer dúvida do leitor "Visitante".  E fica a dica para todos os outros leitores também! A escolha do sistema de referência é sempre uma questão de conveniência na descrição de um fenômeno. Entendido?  


Já publicado no Física na veia!

Sobre o autor

Dulcidio Braz Jr é físico pelo IFGW/Unicamp onde atuou como estudante e pesquisador no DEQ – Departamento de Eletrônica Quântica no final dos anos 80. Mas foi só começar a lecionar física para perceber que seu caminho era o da educação. Atualmente, além de professor, é autor de material didático pelo Sistema Anglo de Ensino / Somos Educação e pela Editora Companhia da Escola. É pioneiro no Brasil no ensino de Relatividade, Quântica e Cosmologia para jovens estudantes do final do ensino médio e início do curso superior. E faz questão de dizer que, aqui no blog, é professor/aluno em tempo integral pois, enquanto ensina, também aprende.

Sobre o blog

"O Física na Veia! nasceu em 2004 para provar que a física não é um “bicho papão”. Muita gente adora física. Só que ainda não sabe disso porque trocou o conteúdo pelo medo. Se começar a entender, vai gostar. E concordar: a Física é pop! Pelo seu trabalho de divulgação científica, especialmente em física e astronomia, sempre tentando deixar assuntos árduos mais leves sem jamais perder o rigor conceitual, o Física na Veia! foi eleito por um júri internacional como o melhor weblog do mundo em língua portuguesa 2009/2010 pelo The BOBs – The Best of Blogs da alemã Deutsche Welle."